terça-feira, 2 de dezembro de 2008

Sermão da Glória de Maria, Mãe de Deus - Parte I



Bem se concordam, neste dia e neste lugar, o título da casa com o da festa e o da festa com o da casa: a casa da Senhora da Glória e a festa da glória da Senhora. O Evangelho, que deve ser o fundamento de tudo que se há-de dizer, também eu o quisera concordar com essa glória; mas o que dele e dela se tem dito atègora não concorda com o meu desejo, nem com o meu pensamento. O Evangelho diz que « escolheu Maria a melhor parte» : Maria optimam partem elegit; e os santos e teólogos, que mais se alargaram, aplicando essa escolha e essa parte á glória da senhora, se alargaram, aplicando esta escolha e esta parte à gloria da Senhora, só dizem que verdadeiramente foi a melhor; porque a glória a que a Senhora hoje subiu e está gozando no Céu, é melhor e maior glória que a de todos os bem-aventurados. Os bem-aventurados da Glória, ou são homens ou anjos, e não só em cada uma destas comparações, senão em ambas, dizem que é maior a glória de Maria que a de todos os homens e a de todos os anjos, e não divididos, mas juntos.

Grande glória! grande, incomparável, imensa! O Sol não só excede na luz a cada uma das estrelas, e a cada um dos planetas, senão a todas e a todos incomparavelmente. Por isso a Senhora neste dia se chama «escolhida como o Sol»: Quae est ista quae ascendit, electa ut Sol? O mar não só excede na grandeza a cada uma das fontes e a cada um dos rios, senão a todas e a todos imensamente; por isso a Senhora se chama Maria, que quer dizer mar, e só por este nome (que não tem outra cousa no Evangelho) se lhe aplicam as palavras dele: Maria optimam partem elegit. Isto é, como dizia, tudo o que dizem os santos e teólogos; mas nem o Evangelho assim entendido, nem a glória da Senhora assim declarada, nem a comparação dela assim deduzida, concordam com o meu pensamento. O Evangelho, dizendo: optimam partem, parece-me que quer dizer muito mais. A glória de Maria, sendo de Maria Mãe de Deus, parece-me que é muito maior, e a comparação com os outros bem-aventurados sòmente, parece-me muito estreita e quase indigna. O meu pensamento é (Deus me ajude nele!) que a comparação de glória a glória, não se deve fazer só entre a glória de Maria com a glória do todas as outras criaturas humanas e angélicas, senão com a glória do mesmo Criador delas, a quem Maria criou. O texto e a palavra optimam a tudo se estende, porque sendo superlativa, põe as cousas no sumo lugar, do qual se não exclui Deus, antes se inclui essencialmente. Neste tão remontado sentido, pretendo provar e mostrar hoje que, comparada a glória de Maria com a glória do mesmo Deus e fazendo da glória de Deus e da glória de Maria duas partes, a melhor parte é a de Maria: Maria optimam partem elegit. Até não me ouvirdes, não me condeneis. E espero que me não haveis de condenar, se a mesma Senhora da Glória me assistir com sua graça. Ave Maria.

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